1 de nov. de 2011

Ética de Espinosa e a Comunicação


Para compreender o pensamento espinosano precisamos contrastá-lo com o pensamento platônico. Neste predomina o dualismo. A separação entre corpo e alma, do mundo material e do mundo espiritual, do plano físico e do plano abstrato. Para Platão, o mundo das ideias tem soberania em relação ao mundo do corpo. Desta forma, há um mundo ideal que age sobre o corpo e determina seu comportamento.

A visão de Espinosa é completamente oposta. O pensamento espinosano é monísta, ou seja, não há separação entre matéria e pensamento. O mundo das ideias e o mundo material são um só e complementares. É o corpo material quem pensa, quem produz ideias. E estas ideias surgem a partir dos afetos sentidos pelo corpo. Portanto, o pensamento, para Espinosa, está diretamente ligado aos afetos e por eles é formado. Não há pensamento sem afeto e não há afetos sem pensamento. Estes afetos são as interpretações que o corpo dá aos encontros com o mundo. Estamos o tempo todo nos encontrando com o mundo. A todo instante as partes relacionam-se com outras partes, e assim, formam o todo. A palavra encontro é inseparável da palavra relacionamento. Desta forma, somos parte do mundo e a todo o momento estamos nos relacionando com outras partes. A relação estabelecida entre as partes as transformam de forma mútua. Nós estamos o tempo todo modificando o mundo e o mundo está da mesma forma nos transformando. Portanto, os encontros que acontecem a todo instante transformamambas as partes. No instante seguinte aos encontros já não somos mais os mesmo indivíduos. Fomos modificados em maior ou menor grau dependendo da intensidadedos afetos gerados pelo encontro.

Desta forma, relações, para Espinosa, são encontros que ocorrem entre as partes que se transformam a parti dos afetos produzidos em cada um. Os afetos criados graças ao encontro entre as partes que interagem, mas eles são sentidos individualmente.

Vamos ilustrar um pouco. Por exemplo,uma pessoa qualquer estabelece relações (encontros) com diversas pessoas. Ela se relaciona melhor com umas do que com outras. Se relacionar melhor quer dizer então que ela transforma e é transformada mais por algumas pessoas do que com outras.

E a comunicação? Onde entra nesta história? A comunicação faz parte dos encontros entre as partes. O ato comunicativo é um encontro. Transforma tanto o emissor como o receptor. Podemos dizer que a comunicação é o ponto de contato entre as partes durante o encontro. E pela ótica de Espinosa, a comunicação não é apenas transmissão de informação. Ela é produto e produtora de afetos. A comunicação é criada pelo pensamento consciente ou inconsciente. E o pensamente é criado a partir dos afetos. Desta forma a comunicação é afetiva. Como os encontros transformam as partes envolvidas. O ato comunicativo provoca modificações em ambos.

Cada encontro é único, portanto cada ato comunicativo é único. Mesmo que a mensagem, aparentemente, seja a mesma, os indivíduos envolvidos já não são mais os mesmos. Eles se transformaram. São “novas”pessoas no próximo instante que a comunicação se repetir. Quanto mais encontros duas partes estabelecem, mais elas vão se transformando e mais duradoura vai se tornando esta relação. Podemos assim dizer que um relacionamento que perpetua num longo intervalo de tempo é aquele que se estabelece por encontros que se repetem entre duas partes. E esta repetição vai transformando aos poucos, dependendo da intensidade dos afetos produzidos, cada parte em um novo individuo. Portanto, a cada encontro podemos dizer que “nasce” um novo indivíduo diferente do primeiro graças à outra parte.

Podemos estabelecer valor às coisas que nos relacionamos a partir da qualidade dos afetos que tais coisas nos proporcionam. Dizemos que algo é “bom” se as transformações afetivas que ela nos provoca forem positivas, ou seja, caminham para nos sentirmos bem. O contrário, uma coisa é “ruim” se nos provoca afetos negativos, ou seja, fazem nos sentir mal. Desta forma, temos uma ética baseada no pensamento de Espinosa e podemos cuidar para produzir uma comunicação sustentada por esta ética. Onde buscamos estabelecer encontros regidos por atos comunicativos que despertem “bons” afetos entre os interlocutores.

*referência no livro Ética de Espinosa. Relógio D'água Editores, 1992.

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